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Governo Jeová envolvido em esquema criminoso com rombo de mais de R$ 20 milhões

O Açougue Soberano ainda este nome, antes de mudar a razão social

Uma rede criminosa formada para desviar recurso público começa a ser desmontada em Canaã dos Carajás. Essa “associação criminosa” no governo do prefeito Jeová Andrade, segundo as investigações realizadas pela Polícia Civil, já teria causado um rombo nos cofres públicos de mais R$ 20 milhões.

Entre os investigados, está o ex-secretário de Administração, José Moreira Soares, que junto com outras cinco pessoas, são acusados, em processo que tramita na Vara Criminal de Canaã dos Carajás, de falsidade ideológica, corrupção passiva e crimes de lavagem ou ocultação de bem.

O processo de investigação, que iniciou em 2016, com 310 páginas, estava sob segredo de justiça, derrubado agora pelo juiz Lauro Fontes Júnior, por entender que todas as provas já tinham sido juntadas à peça processual.

Também no mesmo dia, o juiz Thiago Vinicius de Melo Queda autorizou a quebra dos sigilos bancários e fiscal dos acusados. A Polícia Civil tinha solicitado ainda o bloqueio e sequestro de bens dos investigados, mas o Ministério Público indeferiu, autorizando só a quebra dos sigilos bancários e fiscal.

Além de José Moreira Soares, são acusados no processo Raquel Cristina Sousa Coelho, Francimar Alves de Souza (o Mazinho), Alciro Moraes da Silva Santos Júnior, David Moreira e Divina Barros Moreira da Silva. Segundo a polícia, eles formariam uma “organização criminosa especializada em fraudar procedimentos licitatórios e ocultar dinheiro obtido ilicitamente dos cofres públicos por meio de laranjas”.

De acordo com as investigações da polícia, desde 2013 os acusados viriam utilizando cinco empresas para cometer as fraudes, sendo que duas funcionavam no mesmo endereço. Até 2016 estas empresas teriam faturado em contratos com a Prefeitura de Canaã dos Carajás, segundo a polícia, R$ 20.952,216,03.

Durante as investigações, que foram conduzidas à época pelo delegado Frabrycio Augusto Oliveira Andrade, foi apurado que o esquema criminoso envolvia diretamente José Moreira Soares, que era secretário de Administração e abriu empresas em nome de laranjas para fraudar licitações e ganhar contratos com a prefeitura.

O esquema também tinha direta participação de Alciro Moraes da Silva, que era diretor do Departamento de Tributos, responsável pela emissão de alvarás de funcionamento dos estabelecimentos empresariais envolvidos nas fraudes, sendo que três são apenas endereços de faixadas e outro era um ‘modesto’ açougue, que não era compatível com o faturamento de mais de R$ 7 milhões.

Nas investigações, José Moreira é tido como peça chave na montagem do esquema criminoso. Usando o cargo, José Moreira Soares, que também é conhecido por Moreira, segundo a polícia, abriu empresas em nome de Francimar Alves de Souza e da mulher dele, Raquel Cristina Sousa Coelho, e passou a partir de 2013 a firmar contratos com o governo.

 Empresas foram criadas para fraudar licitações 

De acordo com as investigações da Polícia Civil, esse ‘rosário de delitos contra o erário municipal’ começou em 2013, através de cinco empresas, envolvendo um grupo de pessoas, incluindo servidores públicos. Esse grupo viria se valendo de diversos artifícios para ‘fraudar o caráter competitivo das licitações’ no município, direcionando para que as empresas criadas por eles fossem as vencedoras.

As empresas envolvidas no esquema são a R C S Coelho-EPP, que tem com o nome de fantasia Boutique da Carne Soberano; V F Da Silva e CIA LTDA-EPP, de nome de fantasia Mercearia F; D.M Da Silva Supermercados-EPP, cujo nome de fantasia é Mercearia DM da Silva; FI Comércio de Alimentos e CIA LTDA-EPP, nome de fantasia Mercearia F Alves; e D.B Moreira da Silva-ME, que tem como nome de fantasia Supermercado Maia.

Nas investigações, a polícia descobriu que três dessas empresas eram apenas de faixadas e duas funcionam inclusive no mesmo endereço, que é caso Mercearia VF e Mercearia F Alves, localizadas no Avenida dos Pioneiros, 179, no Centro de Canaã dos Carajás. Na época, no local não havia sequer identificação das empresas, sendo apenas um prédio sem qualquer atividade o que, para a polícia, está claro que se tratar de “mais um artifício fraudulento para maquiar a ilegalidade na contratação com ente público, malferindo o erário”.

Uma das empresas, que tem endereço nos fundos do Supermercado Maia, seria depósito deste

Após a investigação vir à tona, foi colocada uma faixa no prédio, com o nome da Mercearia F, mas o local seguiu fechado. O prédio, ‘coincidentemente’, fica ao lado da Boutique da Carne Soberano.

Mudança

De acordo com as investigações, que agora estão sendo conduzidas pelo delegado Jorge Carneiro, essas três empresas também mudaram de nome e teriam sido vendidas. No local onde foi colocada a faixa com o nome das Mercearia F, não há mais nenhuma identificação. O local segue fechado. O açougue Soberano também tem novos donos e novo CNPJ.

A outra empresa, que funciona apenas de faixada, segundo apurado nas investigações, é a Mercearia DM da Silva, que consta como localizada à Rua Teotônio Vilela, 526, centro de Canaã dos Carajás. O local, no entanto, é um depósito de lixo e entulho, sem faixada com logotipo da empresa.

Na realidade, o endereço é os fundos do Supermercado Maia, localizado na Avenida Liberdade, 63, que utilizaria o espaço como depósito. Já a Boutique de Carne Soberano, faturou mais de R$ 7 milhões dos sofres públicos, fornecendo alimentos, material de limpeza e até locação de veículos, funcionava em um espaço pequeno. O açougue acaba de mudar de nome e de razão social, além de sócios.

No seu alvará de funcionamento, ele constava como localizado na Avenida dos Pioneiros, sem número. No entanto,  funcionava na mesma avenida, mas no número 181.  A empresa estava no nome de Raquel Cristina Sousa Coelho, esposa de Francimar Alves de Sousa, o Mazinho, que figura como sócio proprietário das empresas V.F da Silva e CIA LTDA e F I Comércio de Alimentos de CIA LTDA.

Esse número 181 consta como o endereço de um prédio em nome de Francimar. Para a polícia, tudo está muito claro. Francimar e sua esposa, na realidade, seriam os laranjas no esquema.

Ele trabalhou como operador de caixa no supermercado Maia onde teria estabelecido uma relação de confiança com José Moreira Soares, que foi por 18 anos funcionário do estabelecimento comercial, chegando à função de gerente. Ao entrar para a vida pública, como secretário de Administração na primeira gestão de Jeová Andrade, José Moreira teria utilizado o ‘amigo’ como ‘testa de ferro ou laranja’ no esquema de fraude.

Isso provaria porque em pouco tempo, o patrimônio de Francimar, de simples operador de caixa, se multiplicou, com ele sendo sócio de empresas vencedoras de licitações com a prefeitura. Com os recursos desviados dos cofres públicos os envolvidos teriam adquirido patrimônios como imóveis, joias, veículos e apartamentos em balneários, feito viagens e havia fortes indícios que também custeariam campanha política.

Valores

O CORREIO apurou junto à instância que tem acesso aos dados mais completos da Prefeitura de Canaã, que as cinco empresas envolvidas continuaram lucrando alto no governo Jeová Andrade, mesmo após as investigações da polícia e até 2017 acumulavam o seguinte faturamento:

RCS Coelho e Cia Ltda – EPP: R$ 16.209.706,31;

VF da Silva e Cia Ltda – EPP: 11.454.695,07;

DM da Silva Supermercado – EPP: R$ 9.590.489,10;

FI Comércio de Alimentos e Cia Ltda: R$ 3.115.233,93;

D.B Moreira da Silva – ME: R$ 2.842.503,62.

Comércios do esquema têm faturamento milionário

No relatório da denúncia oferecida à Justiça, a Polícia Civil aponta que no decorrer das investigações, o que chamou a atenção foram os valores expressivos dos contratos firmados com as cinco empresas, principalmente para fornecimento de gêneros alimentícios.

O que mais causou estranheza e chamou atenção, aponta a polícia, é que uma vez realizada a licitação, na modalidade presencial, tipo menor preço, foram constantes e repetidas vezes que as empresas envolvidas participaram e venceram, sempre dividindo entre elas os lotes provenientes de um mesmo objeto.

“Se não bastasse, também há indícios de formação de conluio, até mesmo de quadrilha, com a participação de servidores, agentes e gestores das verbas públicas do mais alto escalão do município”, diz a polícia, observando que as pessoas envolvidas diretamente na ação delituosa têm relação de parentesco ou de convívio entre si.

Depósito seria a sede de duas empresas ao mesmo tempo: a FI Comércio e a Mercearia VF

A prova disso é que o endereço do Supermercado Maia também consta como sendo o mesmo endereço residencial de Francimar Alves de Sousa, sócio-administrador das empresas já citadas. Da mesma forma como a ‘coincidência’ de uma das empresas ‘fantasma’ ser os fundos do Supermercado Maia, sem contar que as outras três empresas pertencem à Francimar e à esposa, com ‘fortes laços de amizade’ com José Moreira.

De 2013 a 2016 a Boutique da Carne, o ‘modesto’ açougue, segundo a polícia, faturou em contratos com a prefeitura R$ 7.525.514,02; a mercearia VF, R$ 6.238.927,01; mercearia DM da Silva, R$ 5.188.307,37; mercearia F Alves, R$ 1.737.023,88; e o supermercado Maia, R$ 263.443,75. Valores astronômicos para empresas pequenas, sendo que três delas nem sequer funcionavam, segundo a polícia.

Nos relatórios dos bens fornecidos à prefeitura, com recursos oriundos do Fundo Municipal de Saúde e Fundo Municipal da Educação, constam gêneros alimentícios variados, incluindo azeite extra virgem, panelas de pressão, taças, pratos e uma variedade de outros itens que não existiriam em simples mercearias e açougues.

O que, para a polícia, prova a fraude e revela a rede criminosa formada para maquiar notas fiscais e desviar verba pública do município, que tem uma das maiores arrecadações do Estado e do País.

Arrecadação bilionária e gestão marcada por denúncia de corrupção

Desde que assumiu o governo, o prefeito Jeová Andrade já administrou recursos, segundo publicado no Portal da Transparência do Município, de 2013 a 2017 no valor de R$ 1.371.979.094,28, somando o repasse de 2018 da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Mineral (Cfem).

De acordo com o Portal da Transparência, em 2013 o município arrecadou R$ 168.503.307,52; em 2014, a arrecadação foi de R$ 244.520.287,02; em 2015, foi de R$ 325.316.241,74; em 2016, R$ 315.673.251,64; e em 2017 a arrecadação foi de R$ 250.266.006,36.

Este ano, o município já recebeu até o mês de junho R$ 62,7 milhões de Cfem e tem previsão de arrecadação de R$ 271.620.932,36. De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), para 2019 o município prevê arrecadação R$ 351 milhões e, para 2020, de R$ 379 milhões. Ou seja, até o final do seu mandato, Jeová deve gerir recurso de R$ 2.243.600.026,64.

Tanto recurso não reflete em melhorias da qualidade de vida da população. Segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017, Canaã dos Carajás tem uma população de 36.027 habitantes, que enfrenta problemas críticos na área de saúde, saneamento e segurança pública, realidade que vai na contramão do orçamento milionário do município, que tem a mineração como principal matriz econômica.

A gestão do prefeito Jeová Andrade tem sido marcada por denúncias de corrupção. No dia 28 de fevereiro deste ano, o prefeito foi afastado do cargo por até 180 dias por determinação judicial, após denúncia do Ministério Público de irregularidades na contratação de serviços de um escritório de advocacia.

De acordo com o Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), a prefeitura firmou contrato com o escritório de advocacia para prestação de serviços comuns e genéricos entre janeiro de 2017 a 14 de agosto de 2017, no montante de R$1.479.127,28, pagos em 84 prestação. O prefeito voltou ao cargo no dia 20 de março, mas continua sendo investigado. (Tina Santos)

Fonte: Correio de Carajás



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