Diversos estudos mostram os benefícios das atividades físicas no tratamento da depressão (Foto: Bruno Marçal/SAÚDE é Vital)
É triste dizer, mas a depressão está no ar. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 300 milhões de pessoas sofrem com o problema atualmente – houve um aumento de 18% entre 2005 e 2015. E a tendência é que esse número não pare de crescer. Alarmada, a própria OMS lançou um apelo aos países: é hora de todos incluírem o tema em suas políticas públicas de saúde. Acontece que não basta dar remédio a esse montão de gente que está com a mente em apuros. A solução, tanto em matéria de prevenção como no tratamento, engloba outros ajustes, como mudanças de hábito. Nesse sentido, pode apostar: teremos de suar a camisa para reverter a situação. Literalmente.
Novos estudos reforçam o poder da atividade física para o bem-estar psicológico. A ponto de o exercício virar prescrição para pessoas deprimidas (ao lado da psicoterapia e dos medicamentos). “Hoje, em toda especialidade, qualquer médico vai listar uma série de benefícios das atividades esportivas. Na psiquiatria, isso se aplica à depressão”, diz o psiquiatra Marcelo Fleck, chefe do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Embora os impactos do esforço físico na esfera mental sejam um campo de pesquisa novo, multiplicam-se evidências de que caminhar, pedalar e malhar melhoram a qualidade de vida de quem anda pra baixo. “É provável que o efeito do exercício se aproxime muito ao dos antidepressivos”, conta Fleck.
Sabe-se que os esportes promovem a liberação de endorfina, o hormônio do prazer, e de outros neurotransmissores por trás da sensação de bem-estar. Experimentos recentes mostram que suar a camisa também estimula o crescimento de células nervosas no hipocampo, região do cérebro que rege a memória e o humor. Um alento e tanto se você pensar que essa estrutura costuma ser menor entre os sujeitos deprimidos.
Esse estímulo aos neurônios é o que ajuda a entender os reflexos positivos de longo prazo – vai muito além, portanto, da sensação imediata de prazer e dever cumprido após a academia. “A liberação de hormônios não é o que faz a pessoa melhorar. A superação da doença tem a ver com a regeneração neuronal”, revela o educador físico e doutor em psiquiatria Felipe Schuch, do Centro Universitário La Salle, em Canoas (RS). Só que esse efeito terapêutico depende de regularidade.
Volta no parque: existem indícios de que o contato com a natureza aprimora o bem-estar mental. Que tal caminhar sob as árvores?
Hora da limpeza: até uma vassoura pode ajudar quem não curte exercícios. Um estudo diz que fazer faxina melhora em até 23% o humor no dia.
Estica-e-puxa: alongar-se com frequência faz o oxigênio circular melhor pelo corpo e traz alívio à mente por um momento.
Jardinagem: cuidar de uma horta ou de plantas ornamentais ocupa a cabeça e nos obriga a abaixar, levantar… A cuca agradece.
Um estudo do professor Felipe Schuch realizado com pacientes com depressão severa internados no Hospital de Clínicas de Porto Alegre constatou que pessoas submetidas a um pacote que combinava medicações e atividade física apresentavam melhores resultados do que aquelas que só utilizavam comprimidos.
A mudança de hábitos e o combate ao sedentarismo já ganharam tamanha relevância nesse contexto que o próprio psiquiatra deve ficar atento para dosar (ou evitar) o uso de fármacos capazes de levar à indisposição. “Na maioria das situações, porém, o exercício tem uma sinergia com os medicamentos”, tranquiliza Fleck.
Dentro e fora do Brasil, as vantagens da malhação são exploradas não só no tratamento mas também na redução do risco de desenvolver a doença. Nos Estados Unidos, um levantamento do Instituto Black Dog – o termo significa “cão negro”, um dos apelidos do problema por lá – englobando quase 34 mil adultos ao longo de 11 anos concluiu que os praticantes regulares de atividade física enfrentam uma menor probabilidade de ter manifestações da deprê com o passar do tempo.
A análise indica que 12% dos casos de depressão poderiam ser prevenidos se todos os participantes tivessem feito pelo menos uma hora de exercício por semana. Ignorar esse conselho esteve associado a um risco 44% maior de apresentar a condição. Sim, sedentarismo parece chamar a tristeza profunda.
Uma boa notícia é que ninguém precisa virar superatleta para tirar proveito dessa proteção. “É sempre mais fácil começar com uma modalidade com a qual já se tem familiaridade”, afirma Schuch. “E lembrar que o melhor tipo de esporte é aquele que a pessoa faz e de que gosta”, complementa.
Ora, de que adianta ir para a academia se seu negócio não é pegar peso em ambiente fechado? Vá pro parque, pule na piscina… O primeiro passo é começar a se mexer, dentro das suas possibilidades, para que a atitude vire um hábito. Daí, com o suor também vem a alegria.
O principal objetivo ao montar o plano de exercícios de alguém que encara a depressão não é definição ou perda de peso. O crucial é fazer o indivíduo ter novas metas e sentir-se bem. Por isso, o professor precisa conhecer as condições e as limitações do aluno e estimulá-lo na medida, sem forçar a barra.
“O treinador não deve criar a expectativa de que vai dar tudo certo. E não se pode cobrar que o paciente esteja sempre motivado”, diz o educador físico Felipe Schuch.
Exercitar-se com amigos ou familiares é outra boa opção. “Assim como as caminhadas com o cachorro“, aconselha Schuch.
O profissional de educação física também tem que trabalhar junto ao psicólogo ou psiquiatra para saber como lidar com as situações adversas.
Na agenda: monte suas metas e inclua dias para descanso. Aos poucos, o ritmo pode aumentar ou diminuir. Avalie seus avanços.
No seu nível: dê início devagar, até para não se machucar. Conhecer e respeitar seu limite é importante para evoluir e evitar frustrações.
A recompensa: bateu seu próprio recorde? Conte para alguém que ficará contente por você. É um incentivo para manter o foco e continuar sua jornada.
Sem competição: deixe de lado a comparação com outras pessoas e foque no seu próprio desempenho ao longo dos exercícios. Quem ganha é você.
Boa companhia: quem se exercita com um amigo se beneficia de uma redução do estresse até 26% maior do que quem malha sozinho.
Fracione: lembre-se de que regularidade é tudo. Melhor blocar os exercícios na semana do que concentrar tudo para um dia e ficar extenuado.
Menos cobrança: se não conseguir cumprir uma meta, não se culpe nem desista. Passe para o dia seguinte e siga adiante. O essencial é você se sentir feliz.
Com informações de: “Association between physical exercise and mental health in 1,2 million individuals en the USA between 2011 and 2015: a cross-sectional study“, de Sammi R. Chekroud; “Interacting with nature improves cognition and affect for individuals with depression“, de Marc G. Berman; “Horticultural therapy for schizophrenia“, de Yan Lu; “Interventions to improve return to work in depressed people“, de Karen Nieuwnhuijsen; “Exercise your mood”, do Black Dog Institute; Mayo Clinic; artigo “The dark side of competition”, de Paul Gilbert; “The Benefits of Exercise for the Clinically Depressed”, de Lynette L. Craft; Mental Health Foundation; livro Exercise for Mood and Anxiety, de Michael Otto
Fonte: Abril Saúde
Divulgar sua notícia, cadastre aqui!