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Imunidade de curados de covid é incerta, diz presidente do Einstein

A imunidade de quem fica curado da covid-19 é incerta, segundo o presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, Sidney Klajner. A ciência ainda não tem a resposta sobre o grau de proteção de indivíduos que desenvolvem anticorpos para a doença.

Por essa razão, explica Sidney Klajner, será necessário manter os hábitos mais rígidos de higiene que foram disseminados durante a pandemia do coronavírus. Também será preciso praticar isolamento social nas localidades em que os casos de contaminação sigam em expansão.

Para Klajner (pronuncia-se “Klái-ner”), que tem 52 anos e é cirurgião do aparelho digestivo e coloproctologista, só haverá vacinas contra a covid-19 em massa ao longo do 1º semestre de 2021.

O Einstein foi o 1º hospital a registrar oficialmente casos de covid-19 no Brasil. O presidente da instituição relata que não há ainda como dizer qual é o padrão de imunidade que se manifesta em diversas pessoas que se recuperam depois da infecção pelo coronavírus.

Depois da cura, há pessoas que têm imunidade em até 45 dias. Mas outros indivíduos se curam sem desenvolver esse anticorpo, chamado de IGG (imunoglobulinas classe G).

“Existe muita dúvida”, disse Klajner em entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues, apresentador do programa Poder em Foco, uma parceria editorial do SBT com o jornal digital Poder360.

“A gente tem orientado quem tem alta do hospital ou quem se cura depois de 14 dias de sintomas leves a ter um comportamento igual, como se não tivesse tido a infecção, com uso de máscara, álcool em gel. A imunidade não é tão confiável como em outras viroses, como sarampo e catapora”, completou.

O presidente do Albert Einstein acredita que a pandemia ainda deve durar algum tempo no Brasil, afetando datas festivas como o Réveillon deste ano e o Carnaval de 2021. Na melhor das hipóteses, segundo ele, a vacina contra o coronavírus ficará pronta no fim deste ano para a indústria, mas a distribuição em larga escala no mundo não se dará antes de meados do próximo ano.

Sidney Klajner disse que o uso de máscara e de álcool em gel continuará por este período. Também deverão ser mantidas medidas para evitar a aglomeração de pessoas.

“Não existe bala de prata”, afirmou Klajner sobre medicamentos no tratamento de covid-19, citando a hidroxicloroquina e a cloroquina. Ele disse que essas substâncias, apesar de serem utilizadas no tratamento de outras doenças, como a malária, não são eficientes para tratar a patologia provocada pelo coronavírus. Além disso, podem provocar complicações em pacientes com problemas cardiovasculares.

“Todos esses medicamentos estão sendo estudados. Aí entram muitas emoções, muitas paixões. Uma das melhores frases que eu vi neste caminho é que está na hora de a gente voltar a ter 200 milhões de técnicos de futebol e parar de ter 200 milhões de cientistas e médicos”, ironizou o presidente do Albert Einstein.

A covid-19 é diferente de outras doenças respiratórias, explicou. “É uma doença sistêmica. O novo coronavírus acomete nervos, acomete vasos, artérias, sistema nervoso central, o pulmão de uma forma muito mais frequente, mas em cada situação, em cada momento, a gente tem que ter uma caixa de ferramentas de onde possamos tirar a ferramenta adequada”, declarou Sidney Klajner.

O médico criticou a forma como as autoridades públicas adotaram e comunicaram políticas de combate à pandemia. De acordo com o presidente do hospital, houve uma atitude “ambígua” dos governos federal e dos Estados. “O que fez com que parte da população escolhesse em quem eu vou acreditar, a despeito de cada uma das regras impostas por cada município”.

“Só existe o isolamento social como forma de conter a disseminação para que o sistema de saúde não ultrapasse a sua capacidade. E o entendimento de que esse isolamento não seria necessário partiu não da informação pautada pela ciência ou da experiência de outros países, mas muito mais por conta de acreditar não ser necessário, o que já se mostrou ser uma atitude errada”.

Klajner afirmou que, além da transmissão para a pessoa que está nestes locais, há risco de contaminação de familiares e idosos, que correm risco de desenvolver um quadro mais grave.

Mestre em cirurgia do aparelho digestivo pela faculdade de medicina da USP (Universidade de São Paulo), Sidney Klajner ganhou o prêmio de executivo mais influente da Saúde, segundo a revista Healthcare Management do Grupo Mídia, em 2018.

TESTES PARA COVID-19

O Hospital Israelita Albert Einstein anunciou em 21 de maio que fará testes para verificar o grau de disseminação do vírus. De acordo com o presidente da instituição, será possível fazer 25.000 testes por semana –o equivalente a 100.000 por mês.

“Praticamente triplica ou até quadruplica a capacidade que nós temos hoje”, declarou. “Ele é chamado de NGS (sequenciamento de última geração, na sigla em inglês)”.

A coleta é feita com as secreções da rinofaringe (nariz) e da orofaringe (boca). “A sensibilidade do vírus já começa no 1º dia de infecção, porque o vírus está presente. A carga viral maior aumenta a sensibilidade do teste. Então, a chance de o teste não detectar o vírus, estando infectado, é menor do que 10%. Tem mais de 90% de sensibilidade”, afirmou o médico.

Não há falso positivo na testagem.

Ele declarou que ainda não há custo para que o teste seja feito em nível comercial. “O nosso desejo é que a gente possa transferir tecnologia, seja para o governo, seja para o setor privado, para outros laboratórios”, afirmou.

Klajner afirmou que a transferência teria tratativas comerciais.

“A grande vantagem seria ter o teste maciço”, afirmou. “Isso nos dará a informação do quanto imune nós estamos, quanto isolados dos que testam positivos temos que ficar”, completou.

Atualmente, está disponibilizado para pacientes do Einstein. “À medida em que as conversas caminham, tanto com laboratórios de outros países, até a fábrica que produz equipamento, indústria farmacêutica, nós estamos tendo algumas conversas de outros terceiros interessados na tecnologia para que isso possa ser difundido”, disse o presidente da instituição.

A expectativa é de que no fim de junho ou início de julho o teste seja feito em escala mais ampla.

A tecnologia foi patenteada em nível internacional porque não há, segundo ele, precedentes no desenvolvimento da técnica no mundo.

Sidney Klajner disse que há 2 grupos de testes: o que mede a presença do vírus e o que verifica se há anticorpos no organismo, que são as moléculas de defesa que combatem o coronavírus.

Os testes rápidos fazem parte do 2º grupo. Ou seja, verificam se o paciente já teve a infecção. “Numa pandemia onde pouco se conhece a respeito do comportamento imunológico, é normal você ver o número altíssimo de falsos negativos no teste imunológico. Ele hoje serve muito para estudos epidemiológicos, visando a retomada das atividades do que propriamente o diagnóstico”, afirmou o presidente da instituição.

O laboratório de biologia molecular do hospital desenvolveu a metodologia que permitiu ao Einstein fazer o 1º diagnóstico, em 26 de fevereiro.

A tecnologia é usada de forma padronizada internacionalmente para detectar viroses: o PCR (Reação em Cadeia da Polimerase, na sigla em inglês). Ele faz parte do grupo de testes que detectam a presença do vírus. O instrumento é uma ampliação do RNA (ácido ribonucleico), que é identificado por uma técnica já conhecida para outras viroses. A tecnologia é usada de forma padronizada internacionalmente.

“O mundo hoje disputa os reagentes e os insumos para realização do PCR, que é um teste que cada rodada da máquina consegue fazer 96 testes”, disse Klajner.

A tecnologia NGSs foi feita por uma startup vinculada ao Einstein em troca de informações com o laboratório de biologia molecular. Com a máquina, não é necessária a disputa por insumos e reagentes que são usados no PCR, além de ter custo mais barato.

“Cada rodada do equipamento faz 1.536 exames. Quer dizer, 16 vezes mais, permitindo aquilo que o Brasil almeja, que é a testagem em massa para que a gente possa ter a retomada das atividades com mais segurança”, disse Sidney Klajner.

VACINA NO BRASIL

De acordo com o presidente do Albert Einstein, o brasileiro ainda passará 1 tempo longo evitando aglomerações e atividades que elevem a chance de transmissão da doença. Ele estima que se todos os testes que estão em andamento derem certo, como na Universidade Oxford, na Inglaterra, haverá vacina para o Brasil no melhor dos cenários em meados de 2021.

As pessoas que já foram infectadas e que não apresentam mais sintomas têm que continuar a ter cuidado, porque não há certeza na ciência sobre o grau de imunidade que cada uma gera.

Além disso, o vírus tem mutações: há 30 cepas diferentes no Brasil, sem falar em outros países. “Às vezes, o IGG é 1 anticorpo voltado a uma característica genética e a mutação do vírus ‘dribla’ essa imunidade. Existem diversos fatores ainda a serem descobertos e que têm atrasado também, obviamente, a criação de uma vacina, porque a vacina depende da geração de imunidade em uma pessoa”, explicou.

O médico disse que o país poderá passar por 1 processo de reabertura, mas com reforço nas medidas de higiene.

“Infelizmente, a gente vai viver com a sombra, ou com esse fantasma da infecção por um tempo longo”, disse. “Quer dizer: aglomerações como jogos de futebol, cinemas, acho que elas vão voltar de um jeito muito diferente ou aguardar, realmente, o retorno”, afirmou Sidney Klajner.

Segundo ele, a única forma encontrada pela medicina para evitar a transmissão é o distanciamento social.

“A população tem que ter a consciência de que a única forma de evitar a transmissão, principalmente a essa população que é cada vez maior por conta de obesidade, hipertensão, diabetes, mesmo pacientes jovens que têm essas comorbidades… Então, acho que nós vamos viver com essa sombra até o final 2021”, declarou.

PÓS-COVID 19

Sidney Klajner também estima que haverá aumento de casos de negligenciamento no cuidado de outras doenças. Ele citou que, em Nova York, houve alta de 15% nos infartos em casa. Além disso, 25% das cirurgias deixaram de acontecer no tempo adequado durante o período de alta transmissão da covid-19.

“E eu tenho a minha prática: sou cirurgião do aparelho digestivo. Neste último mês eu operei 3 apendicites perfuradas. As 3 com uma semana de dor em casa, que evitou de ir ao pronto atendimento por dor abdominal”, exemplificou. “Hoje, saindo de um centro cirúrgico, conversando com um colega ortopedista, ele operou um tornozelo que estava fraturado há uma semana com dor em casa e com medo de ir ao hospital”.

Para Klajner, hospitais, organizações e institutos de saúde devem criar 1 ambiente que seja seguro o suficiente para tirar o medo da população no tratamento de doenças habituais, sobretudo no controle de patologias crônicas.

“Por exemplo, as oncológicas, que não devem atrasar o seu acompanhamento, seu tratamento, sob o risco de perder o timing adequado do tratamento e trazer complicações”, citou.

Ele comentou uma possível explosão de doenças no período pós-pandemia. Sidney Klajner disse esperar que haja uma grande alta nos casos, principalmente das doenças causadas pelos efeitos do confinamento social.

 “Talvez as doenças que apareceram com a própria necessidade da quarentena, do isolamento, doenças de saúde mental, e aquelas que apareceram e não foram corretamente detectadas, ou que foram tratadas de modo informal e que passaram a ser pesquisadas em momento posterior, talvez até trazendo uma maior dificuldade para o tratamento”, falou.

RESPIRADOR COMO ‘ARMA’

O médico e presidente do Einstein declarou que não há controvérsia sobre a intubação do paciente em grau crítico de covid-19. Ele ressaltou, porém, que pode haver mau uso dos aparelhos respiradores e falta de informação, o que pode levar a lesões no pulmão.

“O ventilador é absolutamente necessário quando a insuficiência respiratória necessita da ventilação mecânica. Porém, quando mal utilizado por equipes que não têm preparo, ele vira uma arma”, declarou Sidney Klajner. “Quando você não indica no momento adequado, ele causa lesão no pulmão”. 

A capacitação da equipe médica para o uso dos equipamentos é fundamental para a prestação do serviço de qualidade no atendimento a covid.

FILA ÚNICA

Os congressistas discutem, em 1 projeto de lei, a possibilidade de fazer uma fila única para o uso de UTI (Unidade Intensiva de Tratamento) no setor público e no setor privado.

O presidente do Einstein afirmou que a situação atual exige 1 número maior de leitos do que o sistema de saúde pode oferecer. “A necessidade de o setor privado participar na ampliação da capacidade, eu acho que ela é fundamental e é isso que o hospital Albert Einstein está fazendo”, destacou.

Klajner afirmou que o hospital controla 1/3 das UTIs do município de São Paulo por meio de 2 hospitais públicos: um hospital de campanha e um pronto atendimento.

Mas ele criticou o modelo de fila única.

“Isso não inclui a requisição do leito puramente simples, físico. […] Você precisa ter a equipe multidisciplinar, a expertise daquela equipe, profissionais de saúde como nutricionistas, fisioterapeutas. É algo que vai junto como o nome leito da UTI. Muitas vezes não adianta emprestar o respirador e o leito se a gente não tiver o entendimento entre o hospital privado com o setor público do custeamento dessas ações a bem de toda a população”, disse Sidney Klajner.

HIDROXICLOROQUINA: SEM EFICÁCIA

Sidney Klajner disse que o hospital adota protocolos baseados em evidências científicas. “Nós nunca adotamos o uso da hidroxicloroquina que não fosse na utilização que nós chamamos compacional ou off-label. É 1 momento em que não há outras formas de tratamento num 1 paciente extremamente severo e que, por conta disso, você usa aquilo que eventualmente é o último golpe que você pode dar”, afirmou.

O médico disse que, como o mundo vive uma pandemia, não há tempo hábil para estudar 1 novo medicamento para o vírus –prazo que pode ser de 3 a 5 anos. Por isso, as nações estudam os medicamentos que já estão no mercado.

“Por ser muito disponível, muitas pessoas e muitos líderes acreditaram que [a hidroxicloroquina] seria uma bala de prata pela não interrupção do setor produtivo do país. Com toda boa intenção, o presidente [Jair Bolsonaro] entendeu que defender a hidroxicloroquina foi uma boa medida”, declarou. “Fato é que não existe nenhum estudo, nenhuma evidência científica que mostre que a hidroxicloroquina beneficia o paciente”.

Ele ainda ressaltou que existem efeitos colaterais em pacientes que mais sofrem com a pandemia, como idosos e cardiopatas.

“O que existe hoje pautado em ciência é a não indicação do uso da hidroxicloroquina, porque não se comprovou benefício”, concluiu.

O presidente do Einstein disse ainda que o hospital lidera uma pesquisa que junta até 100 UTIs pelo Brasil que tratam o paciente para este modelo de estudo, que está em fase de finalização.

Questionado sobre qual medicamento deve ser usado para o tratamento do vírus, ele disse que não há 1 específico. “Todos esses medicamentos estão sendo estudados”, afirmou.

Cada paciente é tratado conforme o vírus se manifesta e como o organismo reage ao criar a imunização.

“Existem pacientes que demoram para dar imunidade e você pode usar, por exemplo, o plasma retirado de quem já teve covid e que tenha uma hiperimunidade. E tem pessoas que vão para o estado muito grave pelo excesso de resposta inflamatória. E aí estão sendo testados medicamentos que diminuem resposta inflamatória como esses imunobiológicos, o tocilizumabe”, disse Klajner.

O paciente que teve covid e desenvolveu anticorpos pode doar sangue e o plasma seria transfundido para outro que tem resposta imune. Isso está sendo feito sob o protocolo de pesquisa do Albert Einstein. Mais de 200 pessoas já receberam a transfusão. Os resultados ainda não foram concluídos.

ISOLAMENTO SOCIAL

O presidente do Hospital Albert Einstein disse que o Brasil é tem várias particularidades regionais e que não dá para comparar o município de São Paulo com uma cidade no interior do Mato Grosso, por exemplo.

“Essas diferenças deveriam ser levadas em consideração na adoção de medidas que mitigassem a transmissão [da covid-19]”, disse Sidney Klajner.

Mas, para ele, a postura ambígua de integrantes dos Executivos federal e estaduais fez com que parte da população escolhesse em quem acreditaria.

“Houve um erro daqueles que não acreditaram que a pandemia poderia assumir a característica de mortalidade que a gente viu, por exemplo, em Manaus, onde no início não se adotou nenhuma maneira restritiva”, afirmou.

Com os casos de covid-19 ainda em expansão, o médico afirmou que o Brasil só poderá sair do isolamento à medida que haja uma reserva de estrutura no sistema de saúde.

“Caso contrário, ao sair da flexibilização com o número aumentando de casos, nós vamos impor ao sistema de saúde a necessidade de atendimento muito maior de casos, colocando em risco o atendimento da população, inclusive daqueles que portam outras doenças”, disse.

DIGITALIZAÇÃO DA SAÚDE

De acordo com o presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, mais de 50% das consultas simples poderão ser feitas por telemedicina.

Ele explicou que a prática já existia antes da pandemia, mas foi aprimorada com o isolamento social. “Casos de alta complexidade, uma medicina mais especializada, por exemplo, oncologia, talvez não seja possível, porque há a necessidade de coleta de exames, de um exame mais minucioso presencial. […] Vai variar muito, mas eu acho que o papel, e aí eu não digo só telemedicina, […] eu digo o atendimento digital e virtualizado, porque como você coloca conexão por banda larga ou por wifi na casa de um paciente, ele consegue fornecer dados de saúde ao seu médico de modo até melhor que o presencial”, afirmou.

Para isso, seria necessário mudar a crença de que o atendimento à distância afasta médicos e pacientes. “O atendimento digital aproxima médico e paciente ao contrário do que se coloca no intuito de não permitir uma nova regulação”, argumentou.

QUEM É SIDNEY KLAJNER

Com 52 anos, é mestre em cirurgia do aparelho digestivo pela faculdade de medicina da USP (Universidade de São Paulo). Fez residência em cirurgia geral e cirurgia do aparelho digestivo pelo Hospital das Clínicas da universidade.

Foi titular da Sociapav (Sociedade Paulista de Videocirurgia) e da Sobracil (Sociedade Brasileira de Cirurgia Laparoscópica) em 1999.

Em 2006, foi membro do American College of Surgeons (Colégio Americano de Cirurgiões). Também participou da redação de livros e trabalhos publicados em revistas internacionais.

Desde 2017 é cirurgião associado da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.

 

Fonte: https://www.poder360.com.br/



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