Nada menos que 18 entidades civis, a maioria de defesa da mulher e combate a violências, assinaram uma nota denunciando fatos graves ocorridos no Hospital Materno Infantil e que atingiram a senhora Deuzirene Dias Pereira de Souza. Elas se baseiam nos relatos e no boletim de ocorrência registrado pelo marido dela, Francisco das Chagas de Souza, na 21ª Delegacia de Polícia Civil de Marabá. A denúncia é de erro médico.
Segundo Francisco, após perceber que havia ausência de batimentos cardíacos do feto, a mulher passou por uma curetagem – procedimento para limpar o útero através da remoção de restos de um aborto incompleto – e foi então que teve seu intestino e útero perfurados durante o atendimento. Diante da gravidade das complicações advindas, ela foi encaminhada ao Hospital Regional, onde encontra-se internada na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), desde o dia 18 de setembro.
De acordo com o relato de Francisco às autoridades policiais, Deuzirene estava grávida, e após uma ultrassonografia detectou que o feto estava com má formação e ausência de batimentos cardíacos.
No dia 14 de setembro (terça-feira) ela procurou o HMI onde foi atendida e internada com o pedido de procedimento da curetagem. Três dias depois, dia 17, foi realizada a limpeza do útero. Contudo, após a curetagem Deuzirene começou a sentir fortes dores e relatou aos enfermeiros o incômodo. No entanto, ouviu que seria “bexiga travada, por causa da anestesia”.
Como as dores não cessaram, a paciente foi transferida para o setor cirúrgico para que passasse por uma avaliação para saber o real motivo das fortes dores.
No dia seguinte, sábado (18), Deuzirene foi submetida a uma cirurgia após detectarem que ela havia tido seu intestino e útero perfurados. O marido relata no B.O que no mesmo dia a esposa foi transferida para a UTI do Hospital Regional de Marabá, onde permanece em estado grave, mas estável.
REAÇÃO
Com a notícia de mais um incidente médico ocorrido dentro de um hospital municipal, cerca de dezoito organizações que lutam pelos direitos das mulheres em Marabá se reuniram e emitiram uma nota de repúdio após mais um registro de violência sofrida por uma mulher dentro de uma casa de saúde.
“Vimos expressar nosso repúdio ao médico autor desse desatino, e ao histórico de violências sofridas pelas mulheres que precisam desse atendimento ao município de Marabá. Esperamos que a Secretaria de Saúde do município determine a abertura de processo de auditoria pelo Departamento de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria (DRCAA) e sejam adotadas todas as providências necessárias”, diz a nota.
Assinam o documento: Grupo Mulher Conte Comigo; Ouvidoria Popular Mulher Conte Comigo; Associação de Mulheres Arco Iris da Justiça; Comissão Pastoral da Terra; Coletivo de Gênero do MST/Pará; Coletivo Juntas; Levante Popular da Juventude; Instituto Zé Cláudio e Maria do Espírito Santo; Comissão da Mulher Advogada-OAB/ Marabá; União Brasileira de Mulheres; Fórum Permanente de Mulheres de Marabá e Região; Coletivo Estadual de Mulheres da CUT; Setor de Mulheres do PSOL; Setor de Mulheres da CST; Coletivo de Mulheres Madalenas Tuíra; Grupo de Mulheres do Cabelo Seco Raízes de Marabá; SINDUNIFESSPA e Coletivo Consciência Negra em Movimento.
Ao CORREIO, Francisco das Chagas, esposo de Deuzirene – hoje internada –, afirmou que a sua vida está de ‘cabeça pra baixo’. Sem trabalhar, correndo atrás de documentos e resolvendo procedimentos sobre a internação da mulher, ele conta que não está passando por dias fáceis.
“Minha parceira que me ajudava no trabalho está entre a vida e a morte. Eu trabalho como autônomo e estou correndo o risco de ate perder o serviço que eu havia conseguido. Não estou indo trabalhar resolvendo algumas questões burocráticas”, relata.
Questionado sobre o estado de saúde de Deuzirene, o marido explica que ela está melhor do que quando saiu do HMI. “Ela passou por um perigo muito grande de perder a vida. Entrou em um princípio de infecção generalizada. Ela está em estado grave. Imagina só uma pessoa passar 12 horas com o intestino perfurado?”, questiona.
Com visitas frequentes ao Hospital Regional desde a internação da esposa, Francisco clama orações a mulher para que ela tenha sua saúde reestabelecida.
RESPOSTA
Questionado pelo CORREIO, Fábio Costa, diretor técnico do HMI, falou sobre o caso que acabou repercutindo nas redes sociais nos últimos dias. O médico sustenta que infelizmente para todo procedimento que existe, há o risco inerente. “Nenhum médico sai de casa para perfurar o intestino de alguém. Mas em um universo de inúmeros procedimentos realizados, infelizmente sempre vão ter casos com complicações”.
Ao falar sobre a curetagem, Fábio conta que é um procedimento de perfuração uterina, onde é inserida uma haste metálica – que não é móvel – para raspar o órgão, que é mole. E quanto mais no início da gestação, maior o risco de complicações.
“O útero é colado na bexiga e logo acima estão as vísceras do intestino. Quando você perfura o útero, corre o risco de atingir o intestino. Infelizmente faz parte do risco inerente há um procedimento”.
O diretor técnico ressalta que há deficiência de leitos e número de médicos no HMI. Segundo Fábio, com o grande número de pacientes atendidos no hospital, existe uma necessidade de que após passar a anestesia a paciente já receba alta. Contudo, isso não é feito justamente por causa de possíveis intercorrências que podem acontecer.
“Atendemos Marabá e mais de 20 municípios da região. Nossa demanda é muito grande. Nossos leitos estão lotados, mas a nossa prioridade aqui dentro é sempre salvar vidas”.
Questionado sobre o suporte prestado à família da mulher, Fábio explica que a equipe do HMI está a disposição para dar o apoio necessário.
“Corremos atrás do encaminhamento para o regional imediatamente. E esse processo de regulação não é fácil. Mas eu estou a disposição se a família quiser conversar”, finaliza.