O inquérito, que investigava o caso como “morte suspeita a esclarecer” foi concluído em 4 de outubro sem indicar o que provocou os traumatismos em Pepita e a matou. A polícia não informa no documento nem sequer se ela foi atropelada por algum vagão do metrô, por exemplo.
Procurada para comentar o assunto, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou por meio de nota divulgada por sua assessoria de imprensa que “o caso foi investigado pelo 17° DP (Ipiranga) e relatado à Justiça no dia 4 de outubro deste ano, sem responsabilidades criminais.”
Ao receber e analisar o relatório da investigação, o Ministério Público (MP) sugeriu que alguém incitou Pepita a se suicidar, o que configura crime. Por esse motivo, o inquérito foi encaminhado para o Tribunal do Júri, que apura crimes dolosos contra a vida.
Apesar disso, a Promotoria não indica quem possa ter incitado a idosa a se matar nem como isso teria ocorrido. A pena para este crime é de 2 a 6 anos de prisão em caso de condenação.
Até a última atualização desta reportagem, o MP não havia respondido os questionamentos, entre eles, se a Promotoria pediu que a polícia volte a investigar o caso para apontar quem é suspeito de supostamente incitar a idosa ao suicídio.
Fotos feitas a partir dos vídeos do Metrô, que mostram Pepita na estação, registraram outros passageiros próximos a ela. Mas como as gravações não têm áudio, não é possível saber se eles conversaram algo que possa ter levado ela a querer se matar. Também não há imagens de ninguém empurrando a mulher, que entrou sozinha no túnel.
Por meio de nota, a promotora Fernanda Martins Fontes Rossi, que sugeriu que o caso possa ter sido de incitação ao suicídio, informou que se manifestou nos autos “e, ante a hipótese de possível suicídio, encaminhei para a PJ [Promotoria de Justiça] do Tribunal do Júri para análise. Não posso fazer essa análise quanto à suposta incitação ao suicídio. Cabe à PJ do Tribunal do Júri tal exame“.
Fotos feitas a partir do vídeo do Metrô mostram Pepita Geraldes ao fundo da plataforma de embarque (no círculo em vermelho) durante a passagem da composição e depois ela não aparece mais quando o trem passa — Foto: Reprodução/Polícia Técnico-Científica de SP
Polícia não cita suicídio
A tese de suicídio levantada pelo MP não está no relatório final da polícia. O documento apenas informa que a mulher morreu por um trauma e foi encontrada sem vida na linha do Metrô.
Um funcionário da estação ouvido pela investigação chegou a dizer que “não é comum a ocorrência de suicídio no local onde o corpo da vítima foi localizado e sim em outras áreas”.
O único filho de Pepita, um comerciante de 59 anos, também refutou a possibilidade de que a mãe possa ter se matado. Em seu depoimento à polícia, ele falou que a idosa “não realizava nenhum tratamento de saúde e tampouco fazia uso de medicamentos antidepressivos”.
A mulher morava com o marido, de 85 anos, na casa do filho, na Vila Prudente, também na Zona Sul. No imóvel ainda moram a neta de Pepita e dois bisnetos. A idosa havia nascido na Espanha, mas veio ao Brasil na adolescência. Depois se casou.
“Somos uma família pequena, mas feliz. Minha avó não tinha motivo para querer se matar, se jogando na frente de um trem do Metrô ou nos trilhos da estação. Ela estava muito feliz, tinha acabado de completar 60 anos de casamento. Por isso não cogitamos suicídio”, falou a médica veterinária Larissa Geraldes, de 34 anos, neta da idosa. “Era bastante religiosa, fazia parte de um grupo hindu que abomina alguém tirar a própria vida.”
Entidade religiosa da qual Pepita Geraldes fazia parte a homenageou nas redes sociais — Foto: Reprodução/Facebook
“A gente queria tentar entender o que aconteceu porque estamos desnorteados. As fotos do vídeo mostram que ela fica perambulando pela plataforma, como estivesse perdida ou procurando alguém. Não sei se ela teve algum esquecimento e foi procurar algo nesse túnel”, disse Larissa.
De acordo com os parentes, ocorreu outra situação estranha após a morte de Pepita: o sumiço de R$ 10 mil da conta conjunta que ela tinha com o marido.
“Isso aconteceu 15 dias depois que ela morreu. Foram vários PIX para várias contas. Muito estranho. Ainda bem que o banco ressarciu. Não sei se tem relação com a morte dela. Cabe à polícia investigar isso”, falou a neta.
Advogado da família fala em confusão e fuga de assaltantes
Advogado Ariel de Castro Alves — Foto: Roney Domingos/g1
Na opinião do advogado Ariel de Castro Alves, que defende os interesses da família de Pepita no caso, o Metrô tem de ser responsabilizado pela morte da idosa. Primeiro porque, segundo ele, não existem portas automáticas de embarque e desembarque na estação para a chegada do trem; depois, porque os funcionários não impediram a mulher de passar pela portinhola e entrar no túnel.
“Provavelmente foi atropelada pelas composições do Metrô, conforme a gravidade das lesões, constatadas nos laudos”, disse Ariel, que cobra o uso de portas automáticas nas plataformas de embarque para evitar o risco de quedas nos trilhos. “Principalmente de crianças, pessoas com deficiência e idosos.”
Segundo o advogado, por essas falhas na prestação de serviços, o Metrô tem de indenizar a família da vítima.
“O Metrô, como empresa prestadora de serviços, deve garantir a vida e a integridade física de seus consumidores e usuários. O que não aconteceu. Por falta de segurança e portas automáticas nas plataformas, por falta de funcionários nas plataformas e estações e por falta de atenção dos funcionários que atuam na central de controle e monitoramento das câmeras e imagens”, disse ele, que pretende entrar com uma ação na Justiça por danos materiais e morais.
Ainda de acordo com Ariel, a polícia precisa esclarecer se Pepita foi alvo de criminosos na plataforma, antes do acidente, já que depois da sua morte ocorreram saques indevidos de sua conta bancária. “O que poderia ter também contribuído para a queda dela, no caso de ter tentado fugir de assaltantes, ou ter ficado nervosa e em desespero, ou mesmo ter sofrido ameaças.”
Por meio de nota divulgada por sua assessoria de imprensa, o Metrô informou que “colaborou com a investigação policial e está à disposição para qualquer esclarecimento à Justiça”.