Nesta quinta-feira (12), o mundo conheceu como é o buraco negro supermassivo e gigante que está no centro da Via Láctea, a galáxia onde está o nosso sistema solar .
Mas como funciona a técnica de captura dessas fotografias e por que, assim como a primeira imagem feita de buraco negro lá em 2019, elas parecem desfocadas ou borradas? A cor laranja que exibem é a real?
O Event Horizon Telescope (EHT) é o projeto de colaboração internacional que faz a observação e a montagem das imagens.
O projeto é formado por 11 observatórios de rádio, distribuídos em 8 locais diferentes, geralmente regiões remotas, de altitude elevada e com uma atmosfera seca, para evitar o efeito de vapor d’água, que dificulta as observações.
França, Espanha, Groenlândia, Chile, Estados Unidos (Arizona e Havaí), México e Antártica são os locais onde os instrumentos estão instalados.
Não há um único instrumento atual produzido pelo homem capaz de capturar uma foto de um buraco negro, nem mesmo os nossos mais modernos telescópios, como o James Webb.
Para observar o Sagitário A* ou o buraco negro da galáxia M87 precisamos de um poder de imageamento que só é possível quando combinamos virtualmente telescópios espalhados pela Terra em um único instrumento. Assim, é como se tivéssemos um gigantesco telescópio do tamanho do nosso globo terrestre.
Dessa forma, ao juntar a potência de cada um desses observatórios temos uma impressionante capacidade de resolução que permite a formação dessas imagens, conta Rodrigo Nemmen, astrofísico e professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, que não teve relação com os trabalhos do EHT.
“Para se ter uma ideia, o EHT conseguiria fazer a imagem, em ondas de rádio, de uma maçã na superfície da Lua”, diz o pesquisador.
A brasileira Lia Medeiros, que participou da colaboração, conta que o funcionamento de um GPS é uma analogia que ajuda a explicar como o EHT opera.
Um receptor de GPS, como o que está nos nossos celulares, trabalha em conjunto com a ajuda de satélites que orbitam a Terra para identificar sua localização exata. Ele recebe sinais de diferentes satélites e calcula quanto tempo esse sinal demorou para chegar até ele. Como esse receptor sabe onde esses satélites de GPS estão, ao calcular o tempo que cada sinal chega, ele tem a informação que precisa: onde está localizado.
“A gente usa uma técnica bem parecida, porque o que a gente está gravando, na verdade é o tempo que cada onda de rádio leva para chegar em cada um dos nossos telescópios”, diz a pesquisadora. “Usamos o tempo que cada telescópio detecta a onda para calcular de onde ela veio na imagem”.
“Essa técnica é chamada de interferometria“, explica ela. “A gente usa esses telescópios e eles agem como um time. Todos apontam para o mesmo lugar no céu ao mesmo tempo”.
Assim, o sinal de cada telescópio grava as ondas de rádio que um buraco negro emite e combina essas informações com o auxílio de relógios atômicos, que garantem a precisão dos dados.
“Cada estação de telescópio na Terra observa esses sinais, faz uma ‘imagem parcial’ de sua perspectiva limitada. Depois, usando técnicas sofisticadas de interferometria e imageamento, tais sinais são combinados formando uma imagem única (‘unindo’ as diversas perspectivas)”.
Mas isso não é algo instantâneo. Pelo contrário. Transportar essas gigantescas informações computacionais leva tempo e processá-las, muito mais.
Somente na foto de 2019, foram produzidos 5 petabytes em imagens (1 petabyte = 1 milhão de gigabytes).
“É o equivalente a 5 mil anos de arquivos mp3 ou a coleção inteira de selfies de 40 mil pessoas durante toda a vida”, comparou o diretor do projeto, Sheperd Doeleman, à época.
Lia explica que as fotos dos buracos negros são diferentes de quaisquer outras que estamos acostumados. Elas não têm pixels, aqueles quadradinhos que formam o menor ponto de uma imagem digital.
Isso acontece porque não estamos tirando uma foto com uma câmera qualquer. As medições que os astrônomos fazem são em um comprimento de onda que o olho humano não consegue ver.
“O que fazemos, na verdade, é tentar aprender sobre as estruturas dessa imagem de um modo diferente”, conta a pesquisadora.
O que é importante entendermos aqui é que esse também não é um telescópio normal, ressalta a pesquisadora, pois cada par de telescópio observa um dado que é então descrito por fórmulas matemáticas em uma informação que é, por sua vez, transformada em imagem.
“Por isso, ele parece que está fora de foco, mas estamos numa resolução ridiculamente alta. São as maiores que conseguimos fazer até então”, diz.
Segundo os pesquisadores do EHT, foi a a adição de instalações de comprimentos de onda milimétricos e submilimétricos em locais de alta altitude que abriram a possibilidade de se obter essas imagens de “uma fidelidade sem precedentes”.
“A imagem está desfocada, pois é uma média sobre uma fonte variável de tempo”, explica Thomas Krichbaum, do Instituto Max Planck de Radioastronomia, que também participou do projeto.
“As limitações de sensibilidade da configuração atual do conjunto de telescópios ainda não permitem que tenhamos imagens ainda mais nítidas. Precisaríamos de mais antenas de rádio para uma melhor qualidade de imagem”, complementa.
Lia conta que essa foi uma decisão que envolveu “muitas e muitas horas” de reunião com os cientistas do projeto discutindo qual cor se adaptaria melhor com a foto.
“A luz que a gente observa tem um comprimento de onda de 1,3 milímetros. Os nossos olhos não enxergam isso. Então não existe uma cor que podemos usar que seria uma “cor certa” para a intensidade dessa onda. É como se fosse uma imagem em preto e branco”, ressalta.
“Estamos mostrando na imagem a intensidade de uma onda de luz. As partes nas imagens que são brancas têm muita intensidade de luz, já as partes mais escuras têm muito pouco. Por isso a gente escolheu [esse alaranjado] porque achamos que ia ficar bonito, mas não é uma cor real porque isso é impossível usar esses dados para fazer uma imagem de cor real”, complementa a brasileira.
Fonte: g1.globo.com
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