O Senado Federal aprovou a PEC (proposta de emenda à Constituição) 1, originalmente conhecida como PEC Kamikaze, que prevê a liberação de gastos do governo federal e a criação de novos benefícios sociais em ano eleitoral, o que seria possível com a decretação de um estado de emergência.
O texto substitui a PEC dos Combustíveis (PEC 16), abandonada pelo governo federal. A votação da nova proposta estava programada para esta quarta (29), mas foi adiada e está sendo realizada nesta quinta-feira (30).
Não. A PEC dos Combustíveis (PEC 16) deixou de ser votada pelo Senado Federal para dar lugar à chamada PEC Kamikaze (PEC 1). Enquanto a PEC 16 tinha o objetivo de criar subsídios para baixar o preço da gasolina, a PEC 1 tem a missão de destravar programas sociais e aumentar a concessão de benefícios em ano eleitoral.
A PEC Kamikaze (PEC 1) é de autoria do senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e foi apresentada em fevereiro deste ano. O relator da proposta de emenda será o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que era o relator da PEC dos Combustíveis.
A PEC dos Combustíveis (PEC 16) foi proposta pelo líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ).
A proposta de emenda é chamada de Kamikaze por colocar em risco as contas públicas. Ela já havia sido apresentada em fevereiro para tentar socorrer os profissionais impactados com a alta dos preços dos combustíveis. Ela passou a ser chamada de Kamikaze porque seu impacto, naquele momento, era estimado em mais de R$ 100 bilhões.
A proposta de emenda pretende ampliar programas sociais, identificados pela campanha de Bolsonaro como fundamentais para recuperar a desvantagem nas pesquisas de intenção de voto para presidente, lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O principal objetivo é aumentar o benefício em R$ 200 até o fim deste ano, o que elevará o valor mínimo pago pelo programa a R$ 600 por família. Outra medida é zerar a fila do programa Auxílio Brasil. Para permitir a elevação de gastos em ano eleitoral, a estratégia será instituir, na própria emenda, um estado de emergência.
O reconhecimento do estado de emergência é necessário, do ponto de vista legal, para permitir a criação de um programa novo, que é o auxílio para os caminhoneiros autônomos. O programa pagará R$ 1.000 para os transportadores autônomos cadastrados na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) até 31 de maio.
A medida tinha impacto previsto de R$ 38,75 bilhões além do teto de gastos do governo. Durante a votação no Senado, porém, o valor chegou a R$ 41,25 bilhões.
Para entrar em vigor, a PEC precisa ser aprovada em dois turnos por três quintos dos parlamentares, tanto pelo Senado quanto pela Câmara dos Deputados. Isso significa ter o apoio de 49 dos 81 senadores e 308 dos 513 deputados. Após a aprovação, ela é promulgada automaticamente, sem necessidade de sanção presidencial.
Ela já foi aprovada em dois turnos pelo Senado nesta quinta (30).
O relator da matéria, o senador e ex-líder do governo Fernando Bezerra (MDB-PE), aponta a Guerra da Ucrânia e o impacto sobre os combustíveis para pedir o reconhecimento do estado de emergência.
O estado de emergência não é regulamentado na Constituição, mas é citado na lei eleitoral como uma situação extraordinária que permitiria a criação de novos benefícios sociais mesmo no ano de realização do pleito. Dentro do governo, ele é visto como um mecanismo semelhante ao orçamento de guerra de 2020, que abriu caminho aos gastos de combate à crise sanitária provocada pela Covid-19.
No Brasil, a lei eleitoral proíbe a implementação de novos benefícios no ano de realização das eleições, justamente para evitar o uso da máquina pública em favor de um dos candidatos. As únicas exceções são programas já em execução ou quando há calamidade pública ou estado de emergência.
No caso da PEC Kamikaze, o estado de emergência seria regulamentado pela própria proposta. Inicialmente, a proposta tinha um artigo para afastar todas as vedações ou restrições previstas na legislação, mas esse dispositivo foi retirado após reação contrária da oposição.
O teto de gastos é uma regra fiscal criada em 2016 e prevista na Constituição. Ele limita o crescimento das despesas à variação da inflação no ano anterior. Por se tratar de um dispositivo constitucional, só uma PEC pode ser usada como instrumento para alterá-lo.
A proposta em discussão no Congresso prevê que as despesas extras com benefícios sociais em 2022 não serão contabilizadas no limite do teto de gastos, ficando também fora do alcance de outras regras fiscais que exigiriam, por exemplo, fontes de receita ou cortes de despesas para compensar a fatura extra.
Essa não é a primeira vez que o governo de Jair Bolsonaro (PL) altera o teto de gastos para ampliar suas despesas. Ao menos cinco emendas já foram aprovadas com mudanças na regra fiscal desde 2019, e outras tantas investidas ocorreram, embora malsucedidas.
A instabilidade naquela que é considerada a principal âncora de credibilidade das contas públicas é apontada por analistas como um dos principais fatores de incerteza em relação ao país, o que se traduz em maior volatilidade do câmbio e das taxas de juros no mercado financeiro.
Mesmo depois de conhecida a fatura extra, o país ainda convive com déficits, o que significa que a conta será bancada via emissão de novas dívidas.
Fonte: folha.uol
Divulgar sua notícia, cadastre aqui!