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Ouça trechos dos áudios que levaram à anulação de condenações do Caso Evandro: ‘Confesse direitinho’

Áudios foram revelados pelo jornalista Ivan Mizanzuk, em 2020, e respaldaram pedido da defesa de condenados para revisão criminal. Revisão ocorreu na quinta (9) e anulou processos contra quatro condenados.

Os áudios que foram utilizados para a revisão criminal que, na prática, inocentou os condenados pela morte do menino Evandro Ramos Caetano, revelaram torturas e que os envolvidos foram coagidos a fazerem falsas confissões.

Em um dos áudios, um interrogador fala para uma das ex-condenadas, Beatriz Abagge, “confessar direitinho”, para ele não “botar” mais a mão nela.

O crime que ficou conhecido como O Caso Evandro aconteceu em Guaratuba, no litoral do Paraná, em 1992. O corpo dele foi encontrado em um matagal, com marcas de extrema violência, após o menino ficar desaparecido por dias.

Os áudios completos, que mostram os acusados recebendo instruções para confessar os crimes, se tornaram públicos em 2020, durante o podcast Projeto Humanos, do jornalista Ivan Mizanzuk, que contou a história do caso. Posteriormente, a história virou série documental da Globoplay.

A revisão criminal ocorreu na quinta-feira (9), em Curitiba. Por três votos a dois, o TJ-PR anulou o processo que envolvia Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira – falecido em 2011, no presídio.

Leia, abaixo, a transcrição de parte dos áudios que foram utilizados na revisão criminal:

Depoimento:

Osvaldo: “Foi, foi isso amigo, eu matei”
Interlocutor masculino: “Quem que tava junto com você?”
Osvaldo: [grita] “Aí, pera aí, amigo!”
Interlocutor masculino: “[…] choque.”
Interlocutor masculino: “Quem que tava junto com você?”
Osvaldo: “Então, eu tava sozinho”
Interlocutor masculino: “Não”
Osvaldo: “Tava”
Interlocutor masculino: “Daí, você levou aonde?”
Osvaldo: “Levei no mato e matei”

Depoimento:

Beatriz: “Eu não olhei no relógio, e depois era noite”
Interlocutor masculino: “Olhe, menina, eu acho nós vamos ter que continuar na nossa sessão, você não tá querendo falar, né?
Beatriz: “Não! Eu to falando, to falando”
Interlocutor masculino: “Você não tá querendo cooperar”
Beatriz: “Era noite”

Depoimento:

Interlocutor masculino: “Tá, quem tava junto?”
Osvaldo: “Tava eu, o de Paula, ela e a mãe dela”
Interlocutor masculino: “E daí, o que vocês fizeram na fábrica?”
Osvaldo: “Levamos a criança pra lá, deixamo…” [fala interrompida por barulho caraterístico de tapa]
Interlocutor masculino: “Heim?”

Depoimento:

Interlocutor masculino: “Mas você sabe quanto que foi…”
Interlocutor masculino: “Foi sete”
Beatriz: “Sete milhões. Pronto.”
Interlocutor masculino: “Confesse direitinho pra nós não botarmos a mão em você mais”

A relevância dos áudio na revisão criminal

Foram os áudios obtidos pelo jornalista que embasaram o pedido de revisão criminal, protocolado pela defesa dos acusados em 2021. Na época, pareceres técnicos apontam que houve violência física durante os depoimentos.

Em agosto de 2023, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) aceitou o uso dos áudios completos como prova. As fitas estavam no processo desde o início, mas para o trâmite, foram usados trechos editados que mostravam apenas a confissão, suprimindo as torturas.

No podcast e na série da Globoplay, Beatriz Abagge detalhou a violência que sofreu por policiais que a interrogaram. Em 2022, o Governo do Paraná fez uma carta com pedido de perdão pelas torturas cometidas contra ela.

“Eles me ditavam e quando eu errava, eles paravam essa fita e ditavam de novo. Se eu errasse, me davam choque de novo. Até sair o que eles queriam”, disse Beatriz na série documental.

O que dizem os envolvidos

Por meio de nota, o advogado Antonio Figueiredo Basto, que defende os agora inocentados, afirmou que “a justiça foi feita”. Além disso, destacou o trabalho do jornalista Ivan Mizanzuk e afirmou, ainda, que os agora inocentes vão pedir indenização na Justiça.

Em nota, o Governo do Paraná afirmou que não faz parte do processo julgado, por isso, “neste momento, cabe ao Ministério Público decidir se irá recorrer da decisão nos tribunais superiores”.

Sobre as ações que tomaria frente a decisão dos desembargadores pela anulação, que não cabe recurso no TJ-PR, em nota, o MP-PR informou que, após tomar ciência da íntegra da decisão, irá tomar as medidas cabíveis.

No curso do Caso Evandro, o MP sustentou que não havia existido tortura nas investigações da polícia. Na sessão de quinta (9), entretanto, o órgão foi favorável à revisão criminal.

Quem eram os acusados

Sete pessoas foram acusadas de envolvimento no assassinato de Evandro:

Airton Bardelli dos Santos
Francisco Sérgio Cristofolini
Vicente de Paula
Osvaldo Marcineiro
Davi dos Santos Soares
Celina Abagge
Beatriz Abagge
O caso teve cinco julgamentos. No último, em 2011, Beatriz Abagge foi condenada a 21 anos de prisão. Celina, mãe dela, não foi julgada por tinha mais de 60 anos e o crime prescreveu.

As penas de Osvaldo Marcineiro e Davi dos Santos se extinguiram porque eles haviam permanecido presos por força de decisões anteriores. Vicente de Paula, outro réu, morreu de câncer no presídio.

Francisco Sérgio Cristofolini e Airton Bardelli foram absolvidos em 2005.

Desaparecimento de Evandro

O menino Evandro desapareceu em 6 de abril de 1992. À época, o Paraná vivia o desaparecimento de diversas crianças na região.

Segundo a investigação, ele estava com a mãe, Maria Caetano, funcionária de uma escola municipal de Guaratuba, e disse a ela que iria voltar para casa após perceber que havia esquecido o mini-game. Depois disso ele nunca mais foi visto.

Após um corpo ser encontrado em um matagal, no dia 11 de abril de 1992, o pai de Evandro, Ademir Caetano, afirmou à época no Instituto Médico-Legal (IML) de Paranaguá ter reconhecido o filho, por meio de uma pequena marca de nascença nas costas.

 

 

 

Fonte: www.g1.globo.com



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