Insumo é alternativa sustentável e pode reduzir o uso de recursos não renováveis. Instituto de Arquitetura da USP irá construir um dos primeiros prédios públicos de madeira do país.
A Suécia vai construir uma cidade toda de madeira. Na Ásia, Singapura inaugurou uma faculdade feita de madeira. A Vila Olímpica de Paris, em 2024, será construída com madeira. E há uma disputa para ver quem fica com o título de prédio mais alto do mundo… em madeira.
Nesta reportagem, você vai entender por que um dos materiais mais antigos do mundo vem sendo visto como o futuro da construção civil. E também verá que:
O uso da madeira, um recurso renovável e que armazena carbono, é uma alternativa mais sustentável em relação ao emprego do concreto e do aço;
No mundo, há incentivos do poder público para aumentar o alcance dessa inovação;
Já no Brasil, ainda estamos “engatinhando” na utilização da madeira na estrutura de construções.
Hoje, graças à tecnologia de ponta, é possível fabricar — em madeira — componentes estruturais como vigas, pilares e lajes. É a chamada “madeira engenheirada”, processada industrialmente.
Com essa novidade, o mundo passou a ver até arranha-céus construídos com esse material. O mais alto era o Mjøstårnet, na Noruega, com 85 metros. Em 2022, ele foi desbancado pelo Ascent, nos Estados Unidos, apenas um metro mais alto. E a previsão é que ele seja superado pelo Canadá, onde está sendo construída uma torre de mais de 100 metros de altura.
Ele trabalha há 25 anos com estruturas em madeira e conheceu alguns destes gigantes de madeira engenheirada.
Mais do que marcos de altura, as construções de prédios têm um valor didático: culturalmente, ainda há resistência com a madeira como estrutura.
Fenômeno semelhante aconteceu quando subiu o primeiro arranha-céu de São Paulo, o Edifício Martinelli, na década de 30. Com a população ainda receosa com a novidade, o italiano Giuseppe Martinelli se mudou com a família para o último andar do edifício, para provar que ele era seguro e confiável.
Pensar na madeira como opção sustentável não é óbvio, já que é comum relacionar seu uso à derrubada de árvores. Mas a matéria-prima dessas construções não vem de vegetação nativa, e sim de florestas plantadas — árvores cultivadas pelo homem com o objetivo de produzir e comercializar madeira.
Assim, é um recurso renovável, diferente do insumo necessário para produzir o concreto e o aço, materiais que hoje dominam a indústria da construção.
Além disso, o processo de fabricação do concreto e do aço hoje gasta muita energia e polui muito. A construção civil é responsável por 38% das emissões de gás carbônico no mundo relacionadas à energia, segundo a agência da ONU para o Meio Ambiente.
Já a madeira, em um metro cúbico, é capaz de estocar até uma tonelada de carbono. Mesmo depois de ela ser cortada e processada, o elemento não é liberado para o meio ambiente.
Um estudo da revista científica “Nature”, publicado em 2022, mostrou que, se até 2100, 90% dos novos moradores das cidades morarem em construções de madeira, a redução de gases do efeito estufa será de 106 gigatoneladas. Hoje, o planeta emite cerca de 40 gigatoneladas por ano.
Também faz parte do senso comum associar madeira à combustão. Por anos, o Laboratório de Produtos Florestais, do governo dos Estados Unidos, fez testes com fogo em construções de madeira engenheirada. Eles construíram pequenos edifícios só para queimar, e o material apresentou uma boa resistência. Além disso, são aplicados produtos para que o fogo não se propague.
Segundo os especialistas, mais do que o fogo, o maior vilão da madeira é a água. Por isso, o grande desafio é proteger o material da umidade.
Veja os pontos negativos do uso do material:
A utilização da madeira engenheirada em construções ainda implica custos maiores em relação aos materiais convencionais. Segundo o engenheiro Alan Dias, a obra pode sair até 30% mais cara. No entanto, ele ressalta que, se o empreendimento for pensado desde o início para ser feito em madeira, o custo pode ser equivalente ao tradicional, de concreto e aço.
Há poucos profissionais familiarizados com a tecnologia, da fabricação à montagem.
Ao comprar a madeira, também é importante estar atento às certificações florestais que garantam que o manejo da floresta plantada respeita todos os requisitos ambientais (do monitoramento da saúde do solo à gestão da fauna).
Apesar de o mundo já ver até arranha-céus de madeira, no Brasil as construções com o material ainda “engatinham”.
O cenário deve mudar nos próximos anos. As partes envolvidas, de fornecedores a incorporadoras, estão expandindo os negócios já de olho em um aumento da demanda.
“A matéria-prima foi um primeiro questionamento. Hoje, a capacidade produtiva é de 110 mil m3 por ano. Isso dá, a grosso modo, 400 mil m2 de área privativa. Tem muito espaço para crescer”, afirmou Nicolaos Theodorakis, CEO da startup Noah, que oferece soluções para construções em madeira.
A academia também está de olho na novidade. O Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) da USP, em São Carlos, irá construir um dos primeiros prédios públicos de madeira do país. A ideia é que o novo edifício da faculdade seja uma nova referência arquitetônica.
“É um cartão de visita. O IAU está bastante animado com esse projeto, no sentido de contribuir nessa mudança de paradigma da construção civil”, disse Akemi Ino, professora do instituto e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Habitação e Sustentabilidade -HABIS/IAU-USP.
Para a professora, a inovação ganharia impulso no Brasil se fosse incentivada pelo poder público, o que já é visto em alguns lugares do mundo.
A região metropolitana de Amsterdã, que reúne 32 municípios na Holanda, estabeleceu que 20% dos novos projetos sejam construídos com madeira a partir de 2025. Na França, 50% dos novos prédios públicos devem ser de madeira ou outro material biológico.
Fonte: www.g1.globo.com
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