“Muitas vezes, para fazer as pessoas nos escutarem, temos que mudar a abordagem, porque senão, sempre vamos bater na mesma tecla falando as mesmas coisas. Ás vezes fica chato, chamam de ‘mimimi’. Reduzem anos de lutas e anos de dor à ‘mimimi'”.
Mari conta que recebe muitos comentários positivos em seus vídeos, mas muitas vezes precisa lidar com internautas compartilhando desinformações e preconceito em seus vídeos — ela porém, afirma “não ligar”.
“Com o vídeo do iPhone, teve muita gente rindo. Muitos indígenas mandaram mensagem me agradecendo, porque a gente escuta muito isso, demais, quase todo o tempo. Recentemente recebi comentários do tipo ‘ah é por isso que o governo paga internet para eles postarem besteiras’, isso é muito ridículo! Eu mesmo pago minha internet e o meu celular com o meu trabalho”.
Em outro vídeo, com muita repercussão, ao ser questionada sobre quantas mulheres um homem Wapichana pode ter, Mari responde — com humor e sem perder a pose — que em sua comunidade o homem só pode ter uma mulher, mas a mulher pode ter quantos maridos quiser.
O vídeo foi visto por quase meio milhão de pessoas que fizeram comentários do tipo “Gostaria de fazer parte dessa cultura”, “Por que na minha cultura não tem isso” e “Se um marido já é complicado, quem dirá cinco”. Mas também, causou o que a miss chamou de “revolta masculina”.
“Nós estamos acostumados a ver no mundo costumes em que só os homens têm o direito de terem mais mulheres. Quando a pessoa me perguntou e eu respondi com ironia, causou uma revolta enorme em vários homens nos comentários desse post. Comentários misóginos e desrespeitosos. Isso é a comprovação de que incomoda”.
“Muitas pessoas deixam comentários horríveis, mas eu sinceramente não ligo, porque no geral, eu recebo mais mensagens de apoio e elogios que me motivam a continuar”.
Mas Mari destaca: nada de seus conteúdos é ensaiado ou possui algum roteiro. Tudo é feito na espontaneidade, no maior estilo denominado por ela de “achei legal e fiz”.
“Meus vídeos e os conteúdos que eu produzo no Instagram, sou eu quem faz. Eu me baseio em alguns reels, alguns stories e tento fazer um conteúdo parecido, só que voltado para a minha realidade. Eu não tenho roteiro, não tem produção, é tudo muito espontâneo”.
A influencer relembra um de seus vídeos que também teve muito acesso, em que ela mostra o passo a passo de como é produzido o beiju — comida típica indígena feita com mandioca.
“Um dos meus primeiros vídeos foi mostrando como faz beiju. Eu olhei que eles estavam fazendo e pensei em gravar o passo a passo. Como ainda estavam raspando a mandioca para fazer mais, eu comecei a gravar. Tinha vídeo deles raspando a mandioca, tinha um ‘curuminzinho’ trazendo os ingredientes, uma lavando a mandioca, outra ralando…”.
“São coisas que acontecem mesmo na hora, eu não faço nada ensaiado, pensando em fazer vídeo, são coisas que acontecem, não é nada planejando, é muito espontâneo. Eu acho que é por isso que alcança muitas pessoas, porque não fica uma coisa forçada”.
Mari Williams fala com muito orgulho que é sim uma influenciadora indígena. Ela reitera ainda que sua missão começou antes mesmo dela passar a usar as mídias digitais. No ensino médio, a miss conta que se envolvia em projetos para empoderar pessoas indígenas na escola em que estudava.
“Desde 2017, quando eu estava no ensino médio, muitos alunos tinham vergonha de se assumirem como indígenas e eu tinha um projeto em que buscava valorizar a cultura musical indígena. Na época, 60% dos alunos eram indígenas, a diversidade de culturas era enorme, tinham indígenas Wapichana, Macuxi, Ingarikó e Taurepang. A gente passava muito tempo lá e sentia falta da comunidade, dos nossos costumes…”.
“Muitos dos meus colegas tinham vergonha de falar que eram sim indígenas e com esse projeto eu buscava levar orgulho para os alunos que vieram de comunidades que estudavam na escola”.
Para Mari, uma de suas maiores conquistas é conseguir conversar com as meninas indígenas que, assim como ela, passam por dificuldades parecidas, mas também por alegrias semelhantes.
“Muitas meninas, na vez que eu mostrei a minha casa na Serra do Sol, que é feita de barro, se identificaram, pois é a realidade delas. Muitas saíram da comunidade e foram para a cidade em busca de melhorias para estudar e querendo ou não, a gente acaba tendo uma dificuldade para retornar à comunidade.”
“Um dos pontos mais positivos que eu colhi disso, foi o respeito e o interesse das outras pessoas pela nossa cultura. Em certas coisas [as pessoas] passaram a se policiar mais, principalmente com pequenos detalhes, pararam de chamar de ‘índio’ e começaram a usar o termo correto que é ‘indígena’, coisas assim”.
Mas Mari Williams deixa bem claro: sua maior prioridade são os seus alunos e sua paixão é estar na sala de aula praticando a docência.
“Meus alunos e o meu trabalho como professora são minhas prioridades. Por isso eu abri mão de muita coisa, de vários encontros, de estar em vários eventos, para poder ir dar aula. É um compromisso que eu assumi antes de ser Miss ou influencer. Na sala de aula, eu sou professora e meus alunos, boa parte deles, não tem acesso às redes ou não sabem o quão importante é esse título de Primeira Miss Indígena”.