Anna diz que os sequestradores faziam questão de mostrar que estavam armados.
“Se eles me perguntassem uma senha e eu falasse que não me lembrava, eles davam uma coronhada na minha cabeça, não para machucar, mas intimidar”, contou Anna. “No meio da tarde, eles apareceram com uma sacola de padaria com refrigerante e pães. Nos ofereceram, mas a gente negou.”
Onda de crimes
Anna contou que a polícia identificou que os assaltantes fizeram três compras na Brasilândia, bairro também na Zona Norte de São Paulo. O delegado, segundo ela, desconfia que a quadrilha que cometeu o sequestro era especializada em roubos de carro e, agora, migrou para esse tipo de crime, que está se tornando cada vez mais frequente.
O delegado titular da 3ª Delegacia Antissequestro, da Polícia Civil, Tarcio Severo, disse à BBC News Brasil, em 2021, que o número de sequestros-relâmpago, crime considerado adormecido, disparou após a implantação do Pix no Brasil.
Segundo ele, há inclusive quadrilhas especializadas em outros crimes que estão “migrando” para roubos envolvendo esse tipo de transação.
Sob o poder dos sequestradores, Anna diz ter mantido a calma. Segundo ela, os criminosos diziam durante todo o tempo que, se elas permanecessem calmas e colaborassem com as informações necessárias, elas seriam soltas sem nenhum dano.
“A gente não chorou nem ficou descompensada. Se a gente tivesse chorando, seria pior. Ficamos tensas, sem escândalo. Eles diziam que não queriam nos machucar. Só queriam o dinheiro. Mas como foi demorando, não tínhamos como acreditar que tudo terminaria bem, pois eles estavam muito drogados,. Estar na mira de alguém alterado nos deixou tensas”, conta.
Ela diz que os assaltantes falavam falavam que as levariam de volta para o carro e as deixaria numa “quebrada”. E depois elas poderiam ir embora.
“Eu nem sabia mais o que sentia. Se ouvir aquilo era bom ou ruim”, diz Anna.
Cardápio de golpes
Pouco antes de serem libertadas, as duas amigas foram vigiadas apenas pelo assaltante chamado de “menor”. Anna diz que ele perguntou como elas foram sequestradas, porque eles têm “um cardápio de golpes”.
A conversa entre as vítimas e o criminoso teria inclusive alongado, entre risadas, segundo Anna. Mas ela conta que, em certo momento, o celular dele tocou, e ele ficou nervoso e começou a tremer.
“Ele disse para a gente ficar quieta, senão a gente morreria, e desapareceu. Depois de 15 minutos, a gente se deu conta que ele tinha nos abandonado, sentadas na raiz de uma árvore enorme. A gente então caminhou um pouco para o lugar por onde achávamos que tínhamos vindo. Mas vimos uma estrada e um carro preto parando, então, falei para voltar e sentar para não dar confusão”, conta Anna.
Mas as amigas acabaram se perdendo. Após andar para outro sentido, encontraram três homens parados, olhando na direção delas.
“Um senhor disse: ‘Pode sair’. Eu olhei para o lado, e tinha uma viatura da polícia. O senhor mora na região, viu os criminosos, desconfiou da movimentação e chamou a polícia. Como eles tinham olheiros, o menino que estava com a gente foi avisado, e ninguém foi preso”, diz Anna.
Os criminosos levaram os celulares das vítimas e dois pares de brincos de ouro. Eles devolveram as bolsas com tudo o que havia dentro, incluindo os documentos. Anna tem um seguro que cobre tudo o que havia na bolsa e recebeu de volta o valor do celular. O carro dela foi encontrado dois dias depois, sem nenhuma avaria.
Após o crime, Anna relata ter tido dificuldades para dormir e que inclusive teve pesadelos.
“Na primeira noite, eu não dormi. Cheguei em casa 22h bem cansada, mas quando deitei, à 1h, acordei achando que o ladrão estava no meu quarto apontando arma contra mim e não consegui dormir. Eu não tive crise de pânico, mas estou sobrevivendo”, conta.
Anna diz que gostaria que a história dela servisse de exemplo para outras pessoas. “A gente precisa ficar mais atento e desconfiar mais das pessoas.”